Liminar
impede estudantes da UFMG realizarem assembleia sobre impeachment
- 30/04/2016 15h08
- Belo Horizonte
Léo
Rodrigues - Correspondente da Agência Brasil
Assembleia de estudantes de
direito da UFMG discute processo de impeachment Coletivo UFMG pela Democracia
Uma liminar concedida na
sexta-feira (29) pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) proibiu o
Centro Acadêmico Afonso Pena (CAAP), entidade representativa dos estudantes da
Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), de
prosseguir com a realização de uma assembleia para discutir o posicionamento
dos alunos diante do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Foi
fixada uma multa diária de R$ 500 em caso de descumprimento.
A decisão, assinada pela juíza
Moema Miranda Gonçalves, provocou revolta entre estudantes que ficaram até as
22h de ontem na instituição discutindo medidas a serem tomadas.
Em seu despacho, a juíza Moema
Miranda alega que "a pauta da Assembleia Geral Extraordinária divulgada
como sendo o posicionamento dos alunos da Faculdade de Direito da UFMG perante
ao impeachment e as consequentes ações decorrentes desse posicionamento fogem
ao objetivo estatutário da entidade estudantil." Para ela, o interesse
primordial a ser defendido pela entidade é o direito à educação e seus eventos
teriam como finalidade complementar e aprimorar a formação universitária.
Segundo a presidenta do CAAP, Ana
Carolina Oliveira, a decisão é uma censura e fere a liberdade de expressão.
Para ela, o movimento estudantil sempre tomou posições políticas. "A
diretoria do CAAP tirou uma posição contra o impeachment, mas sabemos que os
estudantes da faculdade apresentam diversas opiniões. Por isso, discutir o
assunto em assembleia me parece fundamental para que todos possam se manifestar
e construir um posicionamento com mais legitimidade. Ainda mais se tratando de
um processo que é tão jurídico quanto político. E justamente estudantes de
direito não podem discutir o tema?", disse.
A líder estudantil disse que o
oficial de justiça chegou com o mandado por volta de 17h, quando a entidade
estava realizando a segunda chamada para a assembleia e verificando se o quorum
mínimo de 100 presentes havia sido atingido. A atividade foi suspensa, mas os
estudantes decidiram ingressar com um recurso contra a decisão. Também
aprovaram a convocação de uma nova assembleia para a próxima quarta-feira (4),
que deverá acontecer independentemente da liminar ser ou não cassada.
O professor da Faculdade de
Direito Marcelo Cattoni saiu em defesa do CAAP. Para ele, a juíza desconsidera
que o estatuto do CAAP prevê a realização de eventos para discussão e
deliberação de temas de grande repercussão nacional, como é o processo de
impeachment. Também teria havido desrespeito ao direito constitucional de
reunião pacífica, segundo o professor.
"Ela também demonstra
desconhecer toda a trajetória de luta política da entidade. Nos últimos 100
anos, o CAAP esteve mobilizado em todos os momentos decisivos da história do
Brasil. Um ex-presidente da entidade, José Carlos da Mata Machado, foi
assassinado pela ditadura militar, pelo seu engajamento. Há toda uma geração
que resistiu também à ditadura do Estado Novo, que participou da campanha do
Petróleo é Nosso, da reconstitucionalização do Brasil em 1932, das Diretas Já e
do processo de impeachment do presidente Collor", acrescentou Cattoni.
A decisão da juiza Moema Miranda
respondeu um pedido dos estudantes Túlio Vivian Antunes e Maria Clara Barros.
Os autores da ação também acusaram o CAAP de planejar aprovar uma greve contra
o impeachment. Na manhã deste sábado (30), ambos publicaram nas redes sociais
um nota informando que irão encerrar a ação ainda hoje. Segundo o texto, o
objetivo foi alcançado.
"Acreditamos que após esta
repercussão não haverá nenhuma tentativa de votação de greve ou de qualquer
outra matéria de tamanha importância, sem que o corpo discente seja devidamente
informado".
A greve tem sido um recurso
utilizado por estudantes mobilizados contra o impeachment em outras regiões do
país. A União Nacional dos Estudantes (UNE) chegou a convocar uma paralisação
geral nas universidades na última quinta-feira (28). No entanto, Ana
Carolina Oliveira garante que a diretoria do CAAP não cogitou em momento algum
a realização de uma greve. "Se, eventualmente, os estudantes aprovassem
uma posição contra ou a favor do impeachment, poderiam decidir se manifestar
através de nota ou de um ato. Nas reuniões do CAAP, a greve foi
descartada", explicou.
Regimento
Na nota, Túlio Vivian Antunes e
Maria Clara Barros também defendem que, diante da divisão política existente na
faculdade, é legítimo que favoráveis e contrários ao afastamento da presidenta
Dilma Rousseff publicizem suas opiniões. No entanto, discordam que uma assembleia
deva aprovar um ponto de vista. "O que não consideramos legítimo é emitir
uma única posição em nome de todos os alunos, afinal, nem todos os alunos são
favoráveis ao impeachment", defendem.
Os autores da ação também acusam
o CAAP de descumprimento do regimento da entidade. Segundo eles, a assembleia
foi convocada às pressas, em horário que dificulta a presença dos alunos, com o
intuito de aprovar uma greve estudantil contra o impeachment. A magistrada
concordou não haver urgência para realização da atividade, já que o processo de
impeachment vem tramitando há vários meses.
O professor Marcelo Cattoni
discorda e entende que houve uma ingerência descabida do Judiciário. "Quem
deve decidir se um assunto merece ser tratado em regime de urgência em assembleia
estudantil são os órgãos previstos no estatuto do CAAP, a começar pela sua
diretoria. É uma questão que diz respeito ao movimento estudantil, que diz
respeito ao processo de deliberação do qual devem participar os próprios
estudantes, defende.
Para Ana Carolina, o CAAP seguiu
rigorosamente todos os trâmites previstos no estatuto. Ela estranhou a
celeridade do processo. "Segundo nossos advogados, a ação foi protocolada
na quinta-feira (26) às 23h e às 14h do dia seguinte já havia uma decisão liminar",
disse.
A presidenta da entidade
estudantil também se indigna com outras acusações que constam da ação.
"Nós fomos acusados de aparelhamento partidário, e não há sequer um membro
da diretoria do CAAP filiado a partido político. Estamos sendo proibidos de ter
posição. Inclusive, os alunos que entraram com a ação também disseram que
nossos posicionamentos são opostos a grande parcela da comunidade acadêmica.
Então não sei qual é o problema. Basta irem na assembleia e apresentarem seus
pontos de vista. A assembleia é aberta a todos e se delibera por maioria",
reiterou.
Diretas Já
Ex-presidente do CAAP em 1983, no
período da campanha das Diretas Já, Roberto Auad também prestou solidariedade à
atual gestão e lembrou episódio semelhante ocorrido quando integrava a entidade.
"Na época, o CAAP aprovou uma posição a favor da campanha Diretas Já. Da
mesma forma como ocorreu agora, grupos opositores recorreram à Justiça para
tentar impedir a assembleia que discutiria o tema. O Judiciário, porém, não
acatou o pedido. Os setores reacionários sempre recorreram a ações para tentar
impedir a manifestação dos estudantes. A novidade é o acolhimento por parte
desta juíza", disse.
Ele criticou a decisão, lembrando
que diversas entidades têm manifestado sua opinião sobre o processo de
afastamento da presidenta Dilma Rousseff. "A Federação das Indústrias do
Estado de São Paulo (Fiesp) tem uma posição a favor do impeachment. Ninguém foi
lá dizer que ela não pode ter uma opinião. E aliás, ela não fez nenhuma
consulta em assembleia aos seus empresários associados. Foi uma decisão
unilateral da diretoria. O CAAP está democraticamente chamando uma assembleia
para ver o que os alunos acham", disse Auad.
Atualmente, ele é diretor do
Sindicato dos Advogados de Minas Gerais e anunciou que a entidade também irá se
movimentar para derrubar a liminar. "Iremos entrar com um agravo de
instrumento. Tenho convicção de que a decisão será cassada".
Faculdade de Medicina
Faixa na Faculdade de Medicina gera polêmica
Coletivo UFMG pela Democracia
Os posicionamentos de estudantes
sobre o impeachment também têm gerado polêmica na Faculdade de Medicina da
UFMG. No dia 15 de abril, uma faixa foi exposta na janela do edifício com os
dizeres "Golpe nunca mais". Em reunião na congregação da Faculdade de
Medicina realizada na última quarta-feira (27), professores defenderam a
abertura de uma comissão de sindicância para apurar responsabilidades pela
manifestação.
Sem citar nomes, um grupo
intitulado UFMG pela Democracia assumiu a autoria da faixa e classificou de perseguição
política a ideia de uma comissão de sindicância. "Nossa atitude não fere
em nenhum aspecto o regimento interno na UFMG e não causa nenhum tipo de
prejuízo ao zelo institucional da universidade", afirmaram em nota. Eles
também acusaram o Diretório Acadêmico Alfredo Balena (DAAB), entidade
representativa dos estudantes da Faculdade de Medicina da UFMG, de se
disponibilizarem para delatar os autores do ato. "Gostaríamos que o
Diretório Acadêmico se retrate frente a sua própria história de luta pela
democracia", defendeu.
A abertura ou não da comissão de
sindicância ainda será apreciada em nova reunião da congregação. Em nota
divulgada neste sábado (30), o DAAB informou que o representante discente na
congregação apenas respondeu afirmativamente quando questionado se conhecia os
envolvidos no ato, mas que não apresentou qualquer intenção de delatar os
mesmos. A entidade informa também que está realizando "uma agenda de
reuniões e conversas dentro da faculdade objetivando evitar a implementação desse
processo institucional, preservando a imagem e a permanência dos
estudantes."
No dia em que a faixa foi
erguida, o DAAB se posicionou contra o ato. A entidade questionou a exposição
de ideias políticas em um prédio público com grande peso na sociedade. Também
enfatizou que a opinião do médico tem grande impacto devido às assimetrias na
relação entre ele e seus pacientes. "O DAAB não compactua com a forma como
que manifestações na Faculdade de Medicina têm sido realizadas, sejam elas na
forma de panfletos, faixas, adesivos ou infláveis", diz a nota publicada
em 15 de abril nas redes sociais.
Edição: Fernando
Fraga
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