Duas visões:
juristas contra e a favor avaliam pedido de impeachment
Renata
Mendonça e Jefferson PuffDa BBC Brasil em São Paulo e no Rio de
Janeiro
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A direita nao quer perder tempo, precisa retomar o poder agora. Isto é o Brasil. Bandidos travam a vista de todos uma luta de retaliações e poder. Dilma é vítima. Esta em jogo o legado de Lula e do PT.
A base jurídica do pedido de
impeachment da presidente Dilma Rousseff, acatado nesta quarta-feira pelo
presidente da Câmara Eduardo Cunha, é motivo de debate entre alguns dos
juristas mais respeitados do país.
A BBC Brasil conversou com dois deles
- Dalmo Dallari e Ives Gandra Martins -, com opiniões distintas sobre o tema.
Ambos destacam, porém, o componente político do processo, já que são deputados
e senadores que definirão sobre o afastamento da presidente.
Dalmo
Dallari: 'Não há consistência jurídica'
O jurista Dalmo Dallari, um dos nomes
mais respeitados do meio jurídico brasileiro, disse à BBC Brasil estar
"surpreso" com a notícia que "acabara de receber" a
respeito da abertura do pedido de impeachment.
Dallari, que meses atrás emitiu um
parecer jurídico a pedido do advogado de defesa da presidente Dilma Rousseff
avaliando suas chances de se defender de um potencial pedido de impeachment,
diz que continua "absolutamente convencido de que não existe fundamento
legal para a propositura do impeachment" e de que o pedido "não tem a
mínima chance de levar ao impedimento da presidente".
"De fato não há consistência
jurídica. Eu examinei todas as hipóteses, todos os pareceres e argumentos do
pedido de impeachment. Estou absolutamente convencido de que não existe nada de
consistente neste pedido", afirma.
Questionado especificamente sobre as
chamadas pedaladas fiscais do governo para fechar suas contas, principal
argumento do pedido de impeachment formulado pelos juristas Hélio Bicudo e
Miguel Reale Jr e aceito nesta quarta-feira, Dallari diz não ter identificado
crime de responsabilidade fiscal.
"As pedaladas não caracterizam o
crime de responsabilidade fiscal porque não houve qualquer prejuízo para o
erário. As pedaladas configuram um artifício contábil, mas o dinheiro não sai
dos cofres públicos, então não ficam caracterizados os crimes de apropriação
indébita ou desvio de recursos", diz.
"Não há nada nas pedaladas ou no
pedido de impeachment que identifique uma responsabilidade da figura da
presidente da República", complementa o jurista.
Para Dallari, aceitar o pedido de
impeachment era "a única e a última carta na manga" do presidente da
Câmara dos Deputados.
"Ele está muito pressionado pelo
risco de perda de seu próprio mandato, porque há muitos elementos contra ele.
Com este artifício ele vai tentar coagir o PT e outros partidos que apoiam a
presidente para que deem apoio a ele", diz.
Ainda sobre as motivações por trás da
decisão, o advogado diz estamos vivendo "duas questões".
"Uma é a antecipação da campanha
eleitoral, e a outra é essa busca de artifícios por pessoas que praticaram a
corrupção e agora querem agir de qualquer modo", afirma.
Sobre possíveis impactos para a
democracia, o jurista diz que "se trata apenas de uma encenação, de um
gesto teatral. Essencialmente não haverá prejuízo à nossa democracia, porque
não há, de fato, a mínima possibilidade de que isto ocorra".
Ives
Gandra Martins: 'Evidências são inúmeras, a base jurídica é ainda maior'
Autor do primeiro parecer jurídico
favorável ao impeachment, o jurista e professor emérito da Universidade
Mackenzie Ives Gandra Martins acredita que agora, dez meses depois de ter
escrito o documento, a base jurídica para depor a presidente é ainda mais
concreta.
"De lá para cá, as evidências
que apareceram são inúmeras. Quando dei o parecer sobre a culpa da presidente
nos escândalos da Petrobras, o ex-tesoureiro do PT (João Vaccari Neto) ainda
não tinha sido preso, Delcídio Amaral (senador e então líder do governo no
Senado) também não", disse à BBC Brasil. "Hoje a situação é muito
mais complicada. A base jurídica é muito maior", afirmou.
Segundo Martins, outros prefeitos já
foram afastados por crimes de culpa – sem comprovação de dolo, ou seja, de
participação direta no crime – e, portanto, a "negligência e a
imprudência" da presidente ao cometer as chamadas pedaladas fiscais já são
o suficiente como argumentos jurídicos para tirá-la do cargo.
"Pedaladas fiscais são
gravíssimas e tiveram consequências no segundo mandato. Elas foram julgadas no
segundo mandato. E toda hora aparecem escândalos."
"Não estou dizendo que a
presidente Dilma é responsável dolosamente por esses crimes, mas culposamente,
por negligência, imprudência", completou.
"O Superior Tribunal de Justiça
já decidiu pelo afastamento de prefeitos por crimes de culpa. São mandatos
executivos também. Qual é a diferença entre prefeito e presidente? O crime dela
é ter permitido a corrupção que houve."
Apesar da base jurídica, Ives Gandra
Martins reforça que a decisão agora pouco tem a ver com essa área. Para ele, os
argumentos jurídicos "só darão respaldo" a uma decisão que será
plenamente política.
"A decisão vai ser política,
como foi com (o ex-presidente Fernando) Collor. Ele foi afastado pelo
Congresso, mas não foi condenado pelo STF (Superior Tribunal Federal)",
disse.
"Se a população sair para a rua,
os deputados vão votar pelo impeachment. Porque, no Congresso, a maioria (dos
parlamentares) não quer ficar vinculada à corrupção. Mas não é fácil a obtenção
de dois terços (favoráveis ao impeachment). Serão obtidos dependendo da força
da população", reiterou.
Para Martins, o governo perdeu força
política ao longo do ano e virou "oposição" no Congresso e a única
coisa que Dilma Rousseff pode fazer para evitar um impeachment seria
"lutar pelo apoio político".
"Vai ser uma luta política do
que jurídica", finalizou.
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